Diretamente da vida conturbada da redatora, Winnie Pereira e Kau se encontram nessa conversa/entrevista.
Setembro Amarelo é o mês de campanha de prevenção ao suicídio. É o mês em que instituições como o Conselho Federal de Medicina e tantas outras procuram alertar para problemas de saúde mental e seus extremos. Talvez não seja tão consolidado como o Outubro Rosa e as ações que cabem nesse mês talvez ainda não sejam as melhores para lidar com essa questão. Mesmo assim, o Setembro Amarelo, para mim, é importante por jogar luz sobre esse que é um problema de saúde pública que assola o país (sim, além da Covid). O Brasil é, atualmente, o país que tem a maior quantidade de pessoas que convivem com transtornos de ansiedade no mundo. É o país em que mais se consome antidepressivos e antiansiolíticos. Toda a nossa estrutura política, econômica e social se desdobra numa extrema desigualdade social e se constrói sobre um sistema racista, lgbtfóbico e sexista. Trabalha-se demais, passa-se fome, as instituições não dão conta de reduzir as mazelas e assim por diante.
São muitas as razões que fazem com que você e eu, cara leitora, estejamos com nossa saúde mental em cheque. Essa aqui que vos fala convive com problemas de ansiedade e depressão desde a adolescência, mesmo que eu só tenha realmente admitido isso há menos de 3 anos. E claro, quem ainda não tinha se dado conta do risco que sua saúde mental corria, após um ano e meio de pandemia já deve ter realizado essa questão. Estamos vivendo um surto coletivo, um conjunto de pequenos surtos individuais.
Mas, uma ferramenta poderosa que encontrei para auxiliar na minha terapia diária é a arte e a literatura. Seja ao escrever ou a ler, os livros nos auxiliam a lidar com nossos pequenos demônios particulares e a encontrar caminhos para nos centrarmos no que é importante: a vida, a empatia, e o amor. E esses são temas importantes no livro cujo título tem muito a ver com esse mês, “Amar,elo” de Kau Bonnett. Há alguns meses fiz um vídeo resenhando esse livro incrível e depois a própria Kau disse ter assistido e adorado. Por isso, nesse mês de combate ao suicídio, o mês de cor mais solar que anuncia o raiar da primavera, a Madre me convidou para entrevistar Kau Bonnett, autora da trilogia incrível “Amar.elo”, “Com Gratidão” e “Metades Inteiras” e de muitos livros que ainda estão por vir. Confira nosso papo (virtual) a seguir:
Seguindo o meme: Você posta muito no insta (e eu sigo, claro) mas fora dos stories com o você está?
A minha vida tem sido bem inconstante, então eu só tenho tentado lidar com a inconstância dela e a minha, de uma maneira leve.
Kau por Kau: Inconstância e muitas mudanças. Inclusive, amanhã talvez nem pense mais isso de mim.
Um estado de espírito: No momento um estado angustiado e ansioso.
Uma cor: Laranja
Um livro: “Amar.elo”
Um filme: “Soul” – Pixar
Fale-me um pouco sobre você como escritora: O que te motiva a escrever? Você tem um processo ou rotina de escrita?
Sempre tive dificuldade de me considerar uma escritora, acredito que por comparação a outros escritores. Eles sentem e escrevem, né? Fazem o que precisa ser feito. Só que eu não consigo sentar e escrever… pelo menos nas vezes em que eu tentei, não tive sucesso. Então, o que me motiva a escrever, o que me inspira, qual a rotina de escrita, é sempre estar em vulnerabilidade, é sempre estar sentindo a vida. São as horas que eu estou mais com a emoção à flor da pele, né? Então, geralmente praticando algum esporte, amando alguma pessoa, apaixonada por alguma coisa na vida, por alguma situação. Enfim, envolta, realmente, de vida. É onde eu encontro a escrita.
Qual o seu livro favorito entre os que você escreveu?
Respondo com frequência essa pergunta de qual o meu livro favorito, entre os que eu escrevi. E sempre digo que não me identifico mais com “Com Gratidão”, mas olho pra ele com amor, carinho. Porque era quem eu era e como eu podia escrever, né?
“Metades Inteiras” que é apenas um livro de bolso, ele contém frases importantíssimas pra mim, porque vieram de um momento muito importante na minha vida. Eu acho que ele é importante. O “Com Gratidão” eu não me encontro mais tanto. Mas o favorito vai ser o próximo que vem aí, com toda certeza. Será o favorito porque ele vai sair da linha que segue o “Com Gratidão” e o “Amar.elo”, que são os três tópicos, né: vida, motivações e amores e vai entrar nas duas questões maiores da minha vida que são a existência e as despedidas. Porque a gente existe, a forma que a gente existe e porque que a gente se despede tanto, o tempo todo. São essas duas questões que sempre estiveram comigo e que cada vez ficam mais fortes.
Você tem alguma/um autora/autor favorita/o?
Já li muitos livros do Napoleon Hill, mas não tenho como favorito. Não tenho autores favoritos. Mas admiro muito a escrita da Lorena Pimenta.
Pode falar um pouco sobre “Amar.elo”? Motivações para escrever esse livro? Como: o que você estava vivendo quando escreveu? Porque dividir em três partes e o que cada parte significa para você?
Então, as motivações para escrever o livro foi o que eu estava vivendo. Não dava para separar muito e aí eu ia escrevendo. E o que eu estava vivendo quando eu escrevi cada texto está lá no livro (Kau conclui cada uma das partes de “Amar.elo” listando os momentos que vivia quando o texto em questão foi escrito). Mas no momento em que juntei todos eles, acho que foi o momento que… eu não lembro ao certo quando isso aconteceu. Porque o livro se fez enquanto os textos iam acontecendo, enquanto a vida ia acontecendo.
Agora, eu dividi em três partes para conseguir “lincar” com o “Com Gratidão”. Esse foi o intuito. Foi meio que uma resposta, porque o “Com Gratidão” tem lá sobre a Vida, sobre as Motivações e sobre os Amores. Então, Amar.elo vem como uma forma de resposta, dizendo sobre a Vida: Viva!; sobre as Motivações: Respire!; e sobre os Amores: Ame! Apenas isso. E foi um reflexo de um amadurecimento, ainda que curto, ainda que despercebido, e uma resposta (ao “Com Gratidão”) também.
Você (e eu) somos jovens (millennials) mas nossa geração parece muito doente emocionalmente por isso. Você tem algo a dizer sobre isso?
Nenhuma opinião formada sobre, mas não acredito que a “culpa” seja da nossa geração.
Você sente que alguma condição externa, seja social, política, de gênero ou sexualidade, pode ter estimulado seus problemas emocionais?
Sim, isso talvez seja parte da resposta da pergunta anterior, mas não entrarei muito nessas questões.
O que o amor representa para você?
Não só o tema do “Amar.elo”, amor é o que conduz a minha vida. Sempre me esforço para ver tudo com amor, isso me ajuda a levar as coisas mais leves. Nem sempre consigo, mas sempre tento.
O que é liberdade para você?
A liberdade hoje para mim, só existe nos pensamentos e escolhas.
Você tem algum conselho para quem quer começar a escrever e talvez viver da escrita?
Para quem quer começar escrever o conselho é: escreva. Sempre que sentir vontade, escreva.
Para quem quer viver da escrita, não tenho conselhos, pois eu não vivo da escrita. Pelo menos não materialmente, a escrita me dá vida de outras formas.
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Obrigada Kau pela gentileza de responder as minhas perguntas com tamanha franqueza, abertura e honestidade. E pelo Amor de Deus libera logo esse livro novo. Fiquei curiosa. E agradeço a Madre por essa oportunidade.
Caso queiram conhecer um pouco mais sobre o livro “Amar.elo” de Kau, assistam a minha resenha a seguir:
https://www.youtube.com/watch?v=cjN7gvQzO8k&t=12s
Winnie Pereira é leitora parceira da Madrepérola, arquiteta e artista nas horas vagas que ama literatura mais do que tudo e também adora cinema.
“Meu amor pela literatura nasceu antes de mim. Na barriga de mamãe já era embalada pelo poder das palavras. Era ninada pelas vozes suaves de autoras e autores enviando suas mensagens como pássaros pelo ar. Aprendi a ler repetindo esses sons mágicos. Cresci com o nariz grudado nos livros, até a miopia me fazer afastar um pouco os olhos das páginas. Mas vou viver para sempre dentro dessas páginas mágicas, que nos guiam, inspiram, empoderam e modificam. Para Sempre.”